Notícias CEO da Lamborghini: “Eletrificação mais do que uma opção é uma necessidade ditada pela legislação”

Entrevista

CEO da Lamborghini: “Eletrificação mais do que uma opção é uma necessidade ditada pela legislação”

Falámos com Stephan Winkelmann, diretor executivo da Lamborghini, sobre o bom momento da marca e sobre o seu futuro próximo, que será marcado pela eletrificação.

Stephan Winkelmann sentado no Lamborghini LPI800-4 Countach

Stephan Winkelmann, o diretor executivo da Lamborghini, é o alemão mais italiano que conheço, quer na maneira de vestir, quer no seu discurso influenciado pela língua de Petraca, como se nota em algumas interjeições que são mais ricas na língua latina do que no seu alemão nativo.

Nasceu em Berlin, há 57 anos, mas cresceu em Roma, onde estudou ciências políticas, tendo terminado os estudos em Munique.

Começou na Mercedes-Benz em 1993, tendo depois passado para os quadros da Fiat Auto, onde permaneceu uma década (1994-2004) e de onde saiu como diretor executivo da Fiat Austria, Suíça e Alemanha.

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Stephan Winkelmann, diretor executivo da Lamborghini
Stephan Winkelmann, o diretor executivo da Lamborghini.

A Lamborghini teve-o como diretor executivo numa primeira passagem, entre 2005 e 2016, de onde saiu para liderar a Audi quattro (agora Audi Sport) em 2016 e a Bugatti em 2018.

Homem de confiança do Grupo Volkswagen, regressou à presidência da Lamborghini no final de 2020 (sucedendo ao também ex-líder da Ferrari e atual homem forte da Federação Internacional do Automóvel, Stefano Domenicali), posição que acumula com a de diretor executivo da Bugatti.

2022 vai ser um ano recorde

Desta vez, a conversa a dois teve lugar nos bastidores dos testes de condução do Huracán Tecnica, em Valência, e dela ressaltou o otimismo com que Winkelmann encara esta fase de profunda transformação da Lamborghini.

Stephen Winkelmann com Lamborghini Huracán tecnica no circuito de Valência
Stephen Winkelmann posa com Lamborghini Huracán Tecnica, no circuito de Valência

Atravessar a pandemia foi difícil para toda a indústria automóvel, mas a Lamborghini parece ter conseguido «pôr-se de pé» mais depressa do que seria expetável, a avaliar pelos resultados de 2021 e a primeira metade de 2022 — que já é o melhor resultado comercial de sempre, surpreendendo todos, a começar pelo seu líder.

Winkelmann confirma-o dizendo que “não poderia estar mais de acordo, até porque 2021 acabou por ser o ano de recorde de vendas da Lamborghini, com o regresso do mercado em força e mais cedo do que esperávamos. Tanto em volume de vendas como em termos de rentabilidade. E em 2022 a tendência mantém-se, com novo recorde absoluto, com 5090 carros entregues”.

Um crescimento de 4,9% nas entregas face a 2021, além de um salto em lucros de quase 70% (425 milhões de euros) e de 31,9% nos lucros sobre vendas, de acordo com o relatório oficial da marca italiana.

Revolução a caminho

Em julho terminaram os testes de imprensa com o Huracán Tecnica e recentemente, em Pebble Beach — onde há muitos potenciais clientes —, foi a revelação do Urus Performante. Antes do final deste ano será revelado o último modelo com motor V12 puramente a combustão na história da Lamborghini, na Art Basel de Miami.

Lamborghini no Monterwy Car Week
Lamborghini no Monterey Car Week 2022, onde mostrou pela primeira vez o Urus Performance.

Depois… uma revolução, como nos diz Winkelmann: “entre 2023 e 2024 vamos revolucionar por completo a nossa gama de modelos, que passarão a estar totalmente servidos por motorizações híbridas. Iremos manter o motor V12 no sucessor do Aventador (o último dos quais saiu da linha de montagem a 27 de julho e o substituto terá um novo nome), mas com propulsão elétrica a ajudar já no ano que vem; o Urus PHEV será lançado no início de 2024 e o totalmente novo Huracán no final desse ano”.

Ainda assim, este passo acelerado surge atrás da grande rival Ferrari, que já tem três modelos híbridos no mercado e que prometeu o seu primeiro elétrico puro antes de 2025, enquanto o primeiro Lamborghini «a pilhas» só aparecerá três anos depois.

Essa é, aliás uma das motivações para que a Lamborghini «se converta» à propulsão elétrica em tão pouco tempo. Mas não é a única: “Mais do que uma opção, é uma necessidade ditada pela legislação. Mas para além de nos permitir reduzir para metade as emissões de CO2 geradas pelos nossos carros, também vamos melhorar as performances dos Lamborghini nesse futuro muito próximo. E, claro, em 2028 vamos apresentar o nosso quarto modelo, que será o primeiro 100% elétrico para nós”, conclui Winkelmann.

Não há grande vontade em revelar detalhes sobre o primeiro modelo totalmente elétrico, até porque ainda faltam mais de cinco anos para a sua chegada e o segredo é parte da alma do negócio nesta indústria.

Winkelmann sorri quando lhe tento «arrancar» mais alguma coisa, antes de responder com um “… não lhe posso dizer muito mais… será um carro totalmente novo, 2+2 lugares e com uma altura ao solo relativamente elevada. Crossover ou SUV? Não quero limitar tudo a uma palavra, seria demasiado redutor… mas será um carro cool, disso pode ter a certeza”.

Mais de 10 mil Lamborghini por ano?

Parte do otimismo desta nova etapa da vida da Lamborghini vem pelo facto de o atual momento positivo de vendas/lucros se tornar uma verdadeira «almofada financeira» para financiar esta transição de motores a gasolina «puros e duros» para o futuro eletrificado, como o diretor executivo da Lamborghini reconhece: “só para o programa híbrido tivemos que alocar 1,5 mil milhões de euros”.

Stephan Winkelmann na linha de produção do Huracán, ao lado de um STO.
Linha de montagem do Lamborghini Huracán.

O Huracán ainda é o Lamborghini mais vendido de sempre, mas dentro de pouco tempo o Urus vai passar a deter esse estatuto para a Lamborghini, dado que pesa hoje 61% das vendas anuais da marca italiana: “vendemos mais de 20 000 Huracán deste que substituiu o Gallardo em 2014 e é quase uma marca dentro da nossa marca, também pelo sucesso na competição — já vendemos mais de 500 unidades para as corridas, que são os nossos embaixadores no desporto automóvel”.

WInkelmann opina que estes recordes de vendas anuais que deverão deixar a marca muito perto das 10 000 unidades entregues a clientes num ano, não colocam em causa a exclusividade de ter um Lamborghini: “crescemos de dois para três modelos quando lançámos o Urus e entrámos neste novo segmento, muito mais volumoso. Sabíamos que este recorde de vendas iria acontecer, mesmo que continuemos a produzir abaixo da procura”.

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“Quando tivermos o quarto modelo, o primeiro elétrico”, continua, “iremos conquistar um novo tipo de clientes, além de que há cada vez mais pessoas no mundo que têm capacidade financeira para comprar carros acima de 200 000 euros. Não definimos um teto, mas o volume total irá sempre ser uma pequena franja do mercado mundial total, que anda entre os 70 milhões e os 80 milhões de unidades anualmente”.

Lamborghini fábrica.
A «casa» da Lamborghini em Sant’Agata Bolognese, Itália

Mas a barreira dos 10 000 será ou não ultrapassada? “Em 2021 vendemos 8405 carros e isso não acontecerá nem em 2022 nem em 2023. Há sempre limitação de produção em termos de cadeia de fornecedores, por exemplo. Hoje já estamos a trabalhar em três turnos de produção no fabrico da fibra de carbono e muitos fornecedores estão no limite. E cada cliente espera pelo seu carro, em média, 16 meses”.

Sem som e vibrações — será um Lamborghini?

Uma das naturais preocupações que as marcas de automóveis desportivos sentem com a entrada na era da eletrificação tem a ver com a forma como serão afetados sentidos como a audição, o olfato e até o toque — pela vibração que o corpo humano sente a bordo de um carro com motor V10 ou V12.

Lamborghini motor V12
V12, uma das imagens de marca da Lamborghini.

O líder da marca do touro enraivecido sempre vai dizendo que “nestes próximos cinco anos o som e as vibrações vão continuar connosco, nos híbridos plug-in. A partir de 2028 veremos… claro que será diferente, mas está nas nossas mãos criar veículos que sejam emocionais mesmo com propulsão 100% elétrica. Não vamos conseguir ser iguais ao que sempre fomos, mas vamos continuar fiéis ao nosso ADN”.

O modelo elétrico vai trazer novos desafios para a Lamborghini e Winkelmann sabe-o bem com a experiência do Urus: “70% a 80% dos clientes do Urus são novos na nossa marca e claramente procuram um veículo mais compatível com a utilização quotidiana, mesmo que nenhum deles precise de usar o Urus no dia a dia”.

“Curiosamente, estamos a notar que muitos desses novos clientes se sentem bem a partir do momento em que entram nesta nossa comunidade de proprietários, nos nossos eventos exclusivos, etc, e isso faz com que muitos deles comprem também os superdesportivos que nunca tinham considerado”.

Fórmula E não está nos planos

Com a eletrificação do automóvel, os fabricantes viram-se em bloco para as corridas de automóveis que promovam a propulsão do futuro, obrigando a revisões importantes dessas estratégias de marketing promocional.

Lamborghini Huracán GT3 em circuito
Lamborghini Huracán GT3.

Mas a entrada na Fórmula E não está nos planos da Lamborghini: “não iremos por aí e a aposta é no LMDh (NDR: marca confirmou regresso a Le Mans em 2024) que combina perfeitamente com a nossa nova estratégia, em complemento ao que fizemos com o Super Trofeo, o GT3. Para uma pequena empresa como a nossa — cujo fundador nem era um entusiasta das corridas — é um esforço importante e vemos que há muitos fabricantes a entrar oficialmente no LMDh, o que irá tornar a disciplina especialmente interessante”.

Mais conectividade e digitalização

Um outro lado da eletrificação do automóvel tem a ver com a crescente necessidade de oferecer mais e melhores serviços de conectividade e melhor digitalização.

ecrã infoentretenimento Huracán Técnica
Pode ser de nicho, mas a Lamborghini também tem de responder aos mesmos requisitos de digitalização e conectividade que os outros.

A Lamborghini sabe-o, até porque são requisitos fundamentais na China, por exemplo, o segundo maior mercado da Lamborghini: “o gosto do cliente chinês está hoje mais próximo do ocidental do que já foi e a principal diferença que notamos é que o cliente chinês é mais exigente na oferta de conectividade e digitalização do seu carro… mesmo sabendo-se que os nossos superdesportivos não são, regra geral usados para ir do ponto A ao ponto B, mas para ir do ponto A ao ponto A… porque servem para desfrutar da condução. E há muito menos foco nesses aspetos da tecnologia, mas será cada vez mais importante”.

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