Autopédia Porque é que não há mais híbridos Diesel?

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Porque é que não há mais híbridos Diesel?

A Toyota acha que tem razão, a Audi falhou, a Peugeot também tentou e a Mercedes-Benz continua a tentar. Estamos a falar dos híbridos Diesel.

Parece o casamento perfeito, não é? Um motor Diesel aliado a um motor elétrico é daquelas uniões que parece ter tudo para dar certo. Um é poupado e garante muita autonomia, o outro é altamente eficiente, silencioso e «zero emissões». Uma espécie de Angelina Jolie e Brad Pitt versão automóvel, ou Sara Sampaio e eu… — Sara, se estás a ler isto, tens aqui o link para o meu Instagram. Não custa nada tentar rapazes…

Porém, nenhum dos exemplos que dei é perfeito. O casal Brad Pitt e Angelina Jolie já se separou, eu e Sara Sampaio nunca nos juntámos. Nada é perfeito. Quanto às uniões entre motores Diesel e elétricos, a maioria falhou de forma clamorosa traindo a ideia de casamento perfeito. Hoje pode culpar-se o movimento «anti-Diesel», mas a verdade é que esta relação sempre foi complicada — salvo honrosas exceções que veremos adiante.

Nesta batalha a favor da poupança são as motorizações a gasolina (tanto nos ciclo Otto como Atkinson) que estão na dianteira dos acontecimentos. Mas porquê, se os Diesel tinham tudo para dar certo?

A justificação da Toyota

A melhor justificação que ouvi, foi-me dada por um responsável da Toyota. A Toyota nunca acreditou na associação de motores elétricos com motores Diesel. Quando escrevo nunca, é nunca mesmo.

É uma posição forte mas temos de dar crédito à Toyota. Afinal de contas, foi a Toyota que deu o pontapé de partida à eletrificação do automóvel há mais de 20 anos. Enquanto as restantes marcas davam passos tímidos, a Toyota encheu o peito de ar e foi para a frente com o primeiro híbrido de produção em massa. Deu-se bem e os resultados estão à vista.

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Agora escapa-me o nome do responsável da Toyota com quem tive oportunidade de falar durante a apresentação internacional do Prius — mas devia ser algo similar a Tamagochi San. Brincadeiras à parte (até porque o assunto é sério e técnico…) esse responsável da marca nipónica classificou a possibilidade de juntar um Diesel com um motor elétrico como “despropositada”. Esta conversa foi há dois anos e ainda nem tinha sequer rebentado a «caça às bruxas» — leia-se, caça aos Diesel.

Tanto os motores Diesel como os motores elétricos são bons a baixas rotações. Então e nas restantes faixas de rotação? Acreditamos que tem de haver complementaridade entre as soluções. Isso só é possível com motores a gasolina.

Fonte Toyota

A Toyota apresentou-me mais motivos que não são tanto de ordem conceptual, mas sim de ordem prática. Mas para esses problemas de ordem prática vamos usar os exemplos da Audi e da Peugeot.

As tentativas da Audi e da Peugeot

Quando falamos de modelos híbridos Diesel a primeira marca que nos ocorre é a Peugeot. Anunciava a marca francesa em 2011, quando apresentou o Peugeot 3008 Hybrid4, que era a primeira marca a disponibilizar um veículo Diesel associado a um motor elétrico, ou seja um Diesel híbrido.

Os europeus disseram: “Finalmente, alguém que nos entende!”

Porém os casamentos de motorizações Diesel híbridas no seio do Grupo PSA durou pouco tempo. Apenas três modelos conheceram esta solução: Peugeot 3008 Hybrid4, Peugeot 508 RXH e DS5 Hybrid4. Problemas a apontar? Preço e peso. No caso do Peugeot 3008 Hybrid4 o peso das baterias tinham implicações negativas no comportamento e no conforto de rolamento do modelo.

Híbrido diesel
O primeiro Diesel híbrido da PSA. O Peugeot 3008 Hybrid4.

Antes da Peugeot já o Grupo Volkswagen tinha tentado… e falhado. A primeira tentativa do Grupo Volkswagen foi verdadeiramente pioneira. Estávamos em 1987 quando foi apresentado o Volkswagen Golf Elektro Hybrid concept. Um modelo que recorria a um motor 1.6 Diesel acoplado a um motor elétrico associado a uma caixa semi-automática. Foram construídos 20 protótipos de testes mas os elevados custos e o desinteresse pela solução ditaram o fim do projeto.

Híbrido diesel
Golf 2 Elektro-Hybrid. Uma das raras imagens do modelo.

Quem continuou interessada na tecnologia foi a Audi, que viu naquela tecnologia muito potencial para atacar a questão das emissões e dos consumos. Em 1989 a marca apresentou o Audi 100 Avant Duo, um modelo em tudo igual ao antecessor do Audi A6 mas com um motor elétrico associado. Porém, os custos voltaram a ditar o insucesso do projeto.

Híbrido diesel
Um modelo pioneiro, sem dúvida. Talvez demasiado pioneiro…

Em 1996 — mais precisamente em outubro de 1996 — a Audi voltou à «carga» com a apresentação da segunda geração do “Duo”. Desta vez recorrendo à plataforma do recém-apresentado Audi A4.

Este modelo recorria ao famoso motor 1.9 TDI de 90 cv em associação a um motor elétrico de 30 cv montado no eixo traseiro. As baterias podiam ser carregadas numa tomada doméstica — uma estreia mundial num Diesel híbrido — e tinha uma autonomia 100% elétrica superior a 30 km. Soa bem, não soa?

Os testes em estrada prosseguiram e em setembro do ano seguinte, a Audi apresentou em Frankfurt a versão “final” do Audi A4 Avant Duo.

Híbrido diesel
À primeira vista parece um Audi A4 Mk1 como qualquer outro.

Na ótica da Audi tinha tudo para dar certo… menos o preço. O Audi A4 Avant Duo custava o dobro da versão normal. A Audi previa vender 500 unidades/ano mas após alguns meses tinham sido produzidas apenas 60 unidades. Além do mais, os relatórios de utilização em condições “reais” não eram abonatórios ao modelo.

Híbrido diesel
Um alemão a carregar barris de cerveja. Os saudosos anos 90 no seu melhor.

Daqui por uns anos, quando o Grupo PSA abrir o seu «livro de história» — apesar dos resultados aquém das expectativas… — não vai querer saltar as páginas dedicadas a esta tecnologia. Já o Grupo Volkswagen vai remeter os seus Diesel híbridos para as notas de rodapé, com excepção de um fantástico modelo: o Volkswagen XL1.

Híbrido diesel
Este modelo recorria a um motor 0.8 TDI de apenas dois cilindros, associado a um motor elétrico de 27 cv. Os consumos anunciados eram de apenas 0,9 litros/100km. Preço? Mais de 100 000 euros.

Permitam-me dizer que o XL1 é dos Volkswagen que mais gosto — uma verdadeira montra tecnológica 100% funcional. Ainda esteve na calha uma versão equipada com um motor Ducati — que é propriedade da Audi — mas acabou por não avançar. Foi uma pena…

Feita esta viagem pelo passado dos Diesel híbridos, vamos falar do presente.

Volvo e Mercedes-Benz ao «ataque»

Tivemos de esperar 14 anos para voltar a assistir ao lançamento de um Diesel híbrido Plug-in (depois da tentativa da Audi). A marca responsável pelo regresso desta tecnologia foi a Volvo, com o V60 D6 Plug-in Hybrid. Um modelo com 280 cv de potência combinada e prestações muito satisfatórias. Tal como a Peugeot, também a Volvo conheceu algum sucesso com este modelo, que mais uma vez foi prejudicado pelo preço e pelo peso do conjunto. Um modelo que em Portugal, com os apoios estatais até fica com um preço mais simpático.

Entretanto a marca sueca já anunciou o fim da produção do V60 D6 Plug-in Hybrid, que terá um sucessor com uma dieta à base de gasolina e eletrões.

Chegamos à Mercedes-Benz. De todos as marcas, a que mais aposta nos Diesel híbridos atualmente é a Mercedes-Benz. O Mercedes-Benz Classe S 300 BlueTEC Hybrid é o melhor exemplo dentro da gama do construtor alemão.

Híbrido diesel
Um Mercedes-Benz Classe S como qualquer outro mas com quatro cilindros.

Pela primeira vez na história, graças a este sistema, foi possível equipar um Classe S com um motor de quatro cilindros sem beliscar as credenciais de conforto e suavidade do modelo alemão — fazendo esquecer o S 250 CDI BlueEFFICIENCY que não resultou tão bem. Por outro lado, os consumos também saíram beneficiados com esta solução que casa um motor Diesel de 204 cv com um motor elétrico de 27 cv para um binário máximo combinado de 500 Nm. Nada mau rapazes…

Apesar da guerra «anti-Diesel» a marca de Estugarda continua a apostar nestas motorizações devido ao baixo valor de emissões CO2. Um caminho que é impossível ser replicado pelas marcas generalistas devido aos custos inerentes às tecnologias de tratamento de gases de escape dos motores Diesel modernos. Nos carros executivos o preço é importante mas não é o mais importante.

Ainda em 2018 veremos outros modelos da Mercedes-Benz a recorrer a esta tecnologia, nomeadamente o Classe E e Classe C. O Mercedes-Benz Classe A está fora da equação, adivinhem porquê… exatamente: custos! Sempre os custos.

A «meia» solução da Renault

Como vimos, a associação de motores Diesel com motores elétricos no grupo propulsor é uma solução dispendiosa, só possível de diluir em veículos de gama alta. A Toyota vai um pouco mais longe nesta posição de oposição, defendendo de forma intransigente a eletrificação do automóvel tendo os motores a gasolina como ponto de partida seja qual for o segmento.

Dito isto, falta falar da aliança Renault-Nissan. Os franceses da Renault, a par dos japoneses da Nissan, têm apostado na disseminação dos elétricos e desenvolveram uma solução engenhosa para ajudar os motores Diesel a poluírem e a consumirem menos. Não é um verdadeiro híbrido, é antes um mild-hybrid (semi-híbrido).

Estamos a falar da associação do «velhinho» motor 1.5 dCi a um pequeno motor elétrico com apenas 10 kW de potência. O primeiro modelo a usufruir desta tecnologia foi o Grand Scénic Hybrid Assist. Mas com o «aperto» que os Diesel vão sofrer no final deste ano não será certamente o último — um aperto conhecido por WLTP. É possível que o Mégane venha a recorrer também a esta solução .

Ao contrário de todos os exemplos que foram dados ao longo do artigo, no caso da Renault, o motor elétrico não tem autonomia suficiente para ter um papel ativo na propulsão do veículo. É antes um auxiliar ativo da motorização principal sem qualquer ligação direta à transmissão — daí o nome mild-hybrid (semi-híbrido). Está tudo explicado neste artigo dedicado ao lançamento do sistema Hybrid Assist da Renault. De todo o modo, não é caso único. O Audi SQ7 é outro bom exemplo.

Motores híbridos a gasolina vão continuar a dominar

Nestes tempos de incerteza quanto ao futuro do automóvel, que tende para a eletrificação, há duas certezas. Os Diesel estão condenados nas gamas mais baixas (devido aos custos), e caberá às motorizações a gasolina a transição pacifica para os carros 100% elétricos. Dito isto, as soluções Diesel verdadeiramente híbridas só são viáveis nos segmentos mais altos.

A par disto, as motorizações a gasolina estão cada vez mais económicas e eficientes. Junta-se a estes fatores a maior suavidade de funcionamento e silêncio dos motores alimentados a gasolina. É por isso que a esmagadora maioria das marcas recorre a motores híbridos a gasolina.

Veja-se o caso da Toyota, com o bem sucedido Prius. Ou o caso da Hyundai, que lançou uma gama completa Ioniq — que nós testámos e comparámos a todos os níveis para não restarem dúvidas. Temos a Volvo, com os seus «super» plug-in híbridos, nomeadamente os Volvo XC60 e XC90 T8 com potências superiores a 400 cv. O Grupo Volkswagen, que outrora fez dos seus Diesel uma bandeira, segue o mesmo caminho.

Durante os próximos anos os Diesel vão continuar entre nós — não cedam ao alarmismo do mais fatalistas. Mas a verdade é que o seu caminho é cada vez mais estreito.

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