Ensaio Toyota GT-86: O último da espécie?

Desde 40 000 euros

Toyota GT-86: O último da espécie?

A Equipa da Razão Automóvel levou o «desportivo do momento» (também conhecido por Toyota GT-86) até ao Kartódromo Internacional de Palmela. Será que o modelo da casa japonesa está à altura das expectativas? É isso que vamos desvendar...

Toyota GT86

Segunda-feira, 11 horas da manhã – Rapazes aqui têm a chave do Toyota GT-86, o depósito está atestado. Divirtam-se!

Pois é, foi assim com esta simpatia que um dos responsáveis da Salvador Caetano nos cedeu o desportivo que mais tinta tem feito correr na imprensa internacional. Só faltou mesmo uma pancadinha nas costas e o típico «boa sorte» que neste caso foi substituído por um bem mais promissor «divirtam-se». Conhecem melhor forma de começar a semana? Nós não.

Ali estava ele à nossa espera…

Correndo o risco de repetir aquilo que já foi escrito e rescrito vezes sem conta sobre este automóvel, vou dizê-lo na mesma: O Toyota GT-86 é um carro que não liga nenhuma às convenções vigentes na industria automóvel. Enquanto as outras marcas lançam modelos que de tantos componentes que partilham, acabam por ser todos iguais, a Toyota em parceria com a Subaru, lançou um modelo desenvolvido de raiz para ser um desportivo. Não vão encontrar neste modelo os travões do Auris, a suspensão do Avensis ou o motor do Yaris. Não, aqui tudo foi pensado e projetado exclusivamente para esta função: fazer um desportivo.

O motor segue a mesma filosofia. Enquanto as outras marcas optam por recorrer a turbos e a motores de cilindrada mais reduzida, a Toyota optou pela «receita» tradicional: um motor atmosférico, disponível em vários regimes e com uma capacidade generosa de 2.000 cc de cilindrada, bem longe dos 1.400cc ou 1.600cc de outras motorizações europeias.

Mas será que repetir no presente receitas do passado terá sido uma boa opção? É isso que vamos tentar descobrir daqui para a frente. Apertem o cinto!

Na Estrada: a surpresa

Chave na mão, banco regulado, cinto apertado e aí fomos nós a caminho do Kartódromo Internacional de Palmela (KIP), circuito escolhido para «espremer» em segurança tudo aquilo que este modelo tem para dar. Aproveitámos a toada de Lisboa até Palmela, num misto de auto-estrada e estrada nacional, para confirmar algumas surpresas que não esperávamos à partida. O GT-86 é dono de um conforto pouco típico neste tipo de automóveis e a visibilidade é extraordinária. Esperávamos um pisar mais rude e uma postura mais viril. Escusado será dizer que a viagem fez-se em menos de nada…

Tempo de sair de Lisboa em direção a Palmela

Chegados ao destino, tirámos à sorte para saber que conduzia primeiro (eu fiz batota…) e calhou-me a mim a «trabalheira» de dar a  volta inaugural ao circuito palmelão. Confesso que estava apreensivo. A Toyota passou quase um ano a tentar convencer-nos que 200cv de potência são mais que suficientes para criar um verdadeiro desportivo. Será apenas marketing ou será mesmo verdade?

Já não sabia o que pensar, aquilo que tinha sentido na auto-estrada indicava-me exactamente o oposto. O motor parecia curto para os «voos» que o chassi prometia. Felizmente eu estava errado…ai como eu estava errado! Parece que a curiosidade de experimentar cada botão que compunha o simplista tablier do GT-86 tinha-me feito esquecer aquilo que escrevi aqui, num ensaio sobre a diversão ao volante.

No circuito: o chassi revelou-se

Chegado ao circuito bastaram somente 300 metros para que a minha cara fosse assaltada por um sorriso «pateta», exatamente a distância que mediava entre o ponto da minha partida e a primeira curva do circuito. Os dados estavam lançados.

Longe da monotonia da auto-estrada, o Toyota GT-86 estava finalmente como peixe na água: em circuito. O chassi começava a dar os primeiros sinais de ser exatamente aquilo que a Toyota dizia que era. E era mesmo! O entendimento entre mim e o Toyota GT-86 foi imediato, parecíamos amigos de longa data. Tanto assim foi que ao final de apenas três voltas achei que já era tempo de levar a nossa «amizade» para outro patamar. Que é como quem diz, desliguei as ajudas eletrónicas.

Tinha portanto, chegado a hora de castigar os pneus e exorcizar o chassi… Os drift’s sucediam-se a cada golpe de volante, e transportava o momento linear criado pela deriva da traseira, de uma curva para a outra, com a maior das facilidades. Era assim que o Toyota se sentia bem, a ser desafiado. Por esta altura já não restavam dúvidas de que tinha descoberto a sua natureza: a condução «acrobática».

Parte desta naturalidade «acrobática» deve-se à magnifica direção eletrónica com que os japoneses equiparam o GT-86. Direta e com um grau de assistência muito bom, ajuda (e de que maneira…) a conseguir apontar o automóvel para a linha imaginária que desenhamos na nossa mente fracções de segundos antes de uma vez mais, esmagar o acelerador sem impiedade. Vezes e vezes sem conta…

Mais uma curva descrita a compasso…

A toda esta facilidade não é alheia a rigidez do chassi e a sua leveza. A Toyota anuncia pouco mais de 1.200 kg de peso para o GT-86. Graças ao chassi e ao soberbo conjunto de suspensões, até nos circuitos mais «apertados» como o de Palmela, é possível conduzir de «faca nos dentes» sem nunca acharmos que há pouca estrada para demasiado carro.

O motor: Nem mais nem menos…

O motor de quatro cilindros opostos, 2 litros de capacidade e 200cv de potência, desenvolvido em conjunto com a marca nipónica Subaru é constantemente apontado como o «parente pobre» do conjunto. De facto, não esperem um motor capaz de gerar acelerações que esmaguem os ossos ou que altere a velocidade de rotação da terra. Nada disso… É um motor honesto, previsível e que se deixa moldar pelo acelerador.

Sóbrio mas com muito potencial, assim é o motor do GT-86

É um motor bastante «redondo», capaz de rodar com boa disposição em qualquer regime, sem caprichos. Só temos pena que o nosso Toyota GT-86 viesse equipado com uma caixa automática de origem. Algo que lhe retirava algum brilhantismo, e algum factor de diversão em pista.

No entanto não pensem pelas minhas palavras que o GT-86 está sub-motorizado. Digamos que… tem potência com conta, peso e medida. Até porque em abono da verdade, ter «apenas» 200cv ao serviço do pé direito dá-nos uma confiança-extra para fazer «acrobacias» que noutros carros, mais potentes, nem nos atreveríamos a fazer num contacto tão curto. Portanto não vejam os «modestos» 200cv de potência como um defeito, mas antes como parte de uma personalidade muito vincada deste modelo.

O GT-86 no seu habitat natural.

Um motor que como disse anteriormente, foi arquitetado de acordo com um caderno de encargos que já não se utilizava à muito na industria automóvel: cilindros opostos; atmosférico e com uma cilindrada «generosa». Uma excelente base de partida para os amantes da alterações. Há ali muito potencial adormecido, num motor que se espera ter a fiabilidade que é reconhecida à marca japonesa. Porque apesar de a marca insistir que 200cv são suficientes, eu estou em crer que «potência suficiente» é um conceito que para os amantes de desportivos é coisa que não existe.

Conclusão: Um carro moderno com postura «velha guarda»

Depois de mais de 5 horas de «tortura» no KIP e de outras tantas pelas estradas da Serra da Arrábida, chegamos a uma conclusão: O Toyota GT-86 é um carro da «velha guarda».

Aqui não houve lugar para os já habituais turbos, «downsizing», comandos no volante ou suspensões eletronicamente pilotadas. As ajudas eletrónicas estão lá, mas são desligáveis e não se intrometem em demasia nos acontecimentos. Apenas intervêm quando o nosso excesso de optimismo excede as nossas capacidades. Altura em que já não estamos a olhar para a estrada mas sim para a escapatória…

Com o Toyota GT-86 o condutor voltou a ser o centro de toda a ação, é um passo atrás na emancipação do automóvel. Finalmente voltou a ser o Homem quem decide, não é um computador que decide por nós «quando, onde e porquê» começa e acaba a nossa diversão. É um carro tão humano, tão próximo de nós, que corre o risco de parecer desatualizado face à restantes opções do mercado pela simplicidade da sua engenharia e concepção.

Apenas o essencial, num interior simplista e sólido.

E é mesmo um carro simples e da «velha guarda», mas isso não é mau. É na prática um carro como os «saudosos de antigamente» mas com design dos tempos modernos e algumas virtudes dos carros actuais, como o sistema de navegação ou o ar-condicionado.

Ironicamente, são estas características analógicas – em desuso nesta era do digital,  que o vão manter atual durante muitos e muitos anos, e porque não há nada no mercado similar ao Toyota GT-86 por menos de 40.000€ que ofereça um conjunto de sensações e uma gratificação tão grande por tão «pouco».

Parabéns Toyota, depois do AE-86, Supra, MR2 e Célica voltaste a surpreender. Infelizmente, acreditamos que este talvez seja o último da tua espécie. Mas bem haja, ou em japonês: Arigato Toyota!

Toyota GT-86: O último da espécie?

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