Testes Fomos à boleia no Mercedes que já anda quase sozinho no caos de Xangai

Condução autónoma

Fomos à boleia no Mercedes que já anda quase sozinho no caos de Xangai

Experimentámos o novo sistema Drive Assist Pro da Mercedes-Benz no trânsito de Xangai. Com IA e um modo cooperativo, fica um passo mais perto de ser autónomo.

Mercedes-Benz Drive Assist Pro em Xangai - em ambiente urbano de traseira
© Mercedes-Benz

A Mercedes-Benz dá um novo passo no longo caminho até à condução autónoma com o novo sistema Drive Assist Pro, de Nível 2++, com recurso a Inteligência Artificial (IA).

Experimentámos o sistema no lugar do passageiro, com Oliver Löcher, o responsável global de desenvolvimento de produto da marca a partilhar a missão de condução com a nova geração do Mercedes-Benz CLA. Causou boa impressão, tem evoluções relevantes, mas ainda há aspetos a melhorar.

A apresentação deste sistema surge após o endurecimento, por parte do governo chinês, das regras dos sistemas de condução autónoma em abril passado. A maior exigência surgiu depois de um Xiaomi SU7 (em testes de pré-lançamento comercial) ter chocado contra um poste a 97 km/h, provocando três mortes.

Mercedes-Benz Drive Assist Pro em Xangai - em ambiente urbano de frente
© Mercedes-Benz O Nível 3 de condução autónoma marcará a passagem da responsabilidade do ser humano para a máquina e esse é um desafio enorme, tanto quanto as barreiras da legislação.

Como consequência, foram proibidos testes dinâmicos com seres humanos em cenários potencialmente perigosos e banida a utilização de termos como “condução automática”, “autónoma” ou “inteligente” na comunicação pública. É por isso que o mais recente sistema da Mercedes-Benz se chama Drive Assist Pro.

“Importante, porque rivais chineses como a Nio já têm tecnologia semelhante e a Mercedes-Benz não pode ficar para trás”, explica Oliver Löcher, diretor de Integração Total do veículo da marca alemã, que ocupa o lugar do condutor nesta experiência, realizada no quase sempre caótico trânsito da megacidade chinesa.

Na escala da condução autónoma, estamos no Nível 2 (vai do 0 ao 5), no qual o carro pode assumir algumas tarefas com supervisão permanente do condutor. O Nível 3 marcará a passagem da responsabilidade do ser humano para a máquina. O desafio é muito grande, tanto quanto as barreiras da legislação. Por isso, a designação 2++ ainda não gera grande entusiasmo.

A Mercedes-Benz já oferece sistemas de condução autónoma mais avançados, como o Drive Pilot Nível 3 — funcional até 95 km/h e disponível na Alemanha —, mas o novo Drive Assist Pro foca-se exclusivamente no ambiente urbano, onde se concentram os desafios mais complexos.

A grande novidade está na chamada “condução cooperativa”, que permite alternância dinâmica entre humano e sistema, sem que este fique inativo. Ideal para tráfego intenso, com peões e ciclistas.

O que é e como funciona

O Drive Assist Pro combina os mais recentes sistemas de assistência avançada à condução (ADAS), com navegação inteligente e IA, para que o sistema aprenda e se adapte aos padrões do trânsito local e ao comportamento dos condutores.

Em termos de hardware, o Drive Assist Pro utiliza 12 sensores ultrassónicos, quatro radares posicionados nas extremidades do carro, quatro câmaras laterais, quatro de visão surround, um radar de gama média na grelha e câmaras telefoto e grande angular no topo do para-brisas.

Todos estes dados são processados pelo controlador inteligente do Mercedes-Benz CLA, alimentado por IA, em parceria com o sistema de navegação e dados da “nuvem”. “Não usamos mapeamento de alta resolução nem LiDAR, o que torna o sistema mais acessível”, explica Georges Massing, responsável pelo desenvolvimento de funções de condução autónoma.

O Drive Assist Pro aprende a cada metro percorrido. No lugar do passageiro, a bordo do novo CLA, percebe-se que ainda não se trata de condução autónoma. O condutor tem de estar apto a intervir a qualquer momento.

Mercedes-Benz Drive Assist Pro em Xangai - interior
© Mercedes-Benz O condutor tem de estar apto a intervir a qualquer momento, sendo monitorizado por sensores capacitivos no volante e uma câmara posicionada acima do ecrã central.

Se o condutor deixar de tocar no volante, é iniciada uma sequência de alertas aos 15, 30 e 60 segundos, culminando com a paragem do veículo. A diferença face a sistemas anteriores é que agora basta um leve toque no volante para cancelar os alertas — não é preciso segurar constantemente.

Uma manhã agitada em Xangai

Eram 8h00 da manhã e não havia muito trânsito nos arredores da megacidade, o que facilita a missão do Drive Assist Pro. Para começar, o CLA enfrentou uma carrinha estacionada em segunda fila com suavidade. Depois, uma scooter apareceu em contramão, algo… frequente na China. O CLA geriu a situação sem hesitar, interpretando corretamente que não havia risco de colisão.

Mas o que acontece quando o sistema não consegue resolver uma situação? “O condutor deve assumir o controlo total”, responde Löcher, garantindo que o pedido de ajuda é feito com antecedência. Este tipo de decisão exige forte capacidade computacional e algoritmos avançados.

Isso aconteceu duas vezes no circuito de teste que se tornou mais exigente à medida que nos aproximámos do centro da cidade. Nessas ocasiões, Löcher teve de intervir quando o carro quis ir direito a um fluxo de tráfego em sentido contrário, ao virar à esquerda, num cruzamento. Terá aprendido por maus exemplos, porque não faltam condutores em Xangai que têm o estranho hábito de fazer o mesmo…

Tecnologia em evolução constante

O Drive Assist Pro já lida com grande eficácia com o trânsito urbano, mas mostrou algumas hesitações em cruzamentos. Noutros momentos foi excessivamente assertivo, como ao ultrapassar um carro que queria entrar na nossa via ou ao não abrandar perante um peão ainda distante da passadeira.

Mercedes-Benz Drive Assist Pro em Xangai - grupo
© Mercedes-Benz A frota de Mercedes-Benz CLA equipados com o sistema Drive Assist Pro estava camuflada, mas bem identificada.

Os engenheiros admitem que há margem de evolução e que será necessário adaptar o comportamento do sistema a diferentes culturas no que diz respeito à condução.

Tal como hoje existem modos de condução (Comfort, Sport, etc.), no futuro poderá haver perfis de IA, uns para dias mais apressados/agressivos, outros para formas de estar mais relaxadas e corteses ao volante. É que para imitar os humanos, os sistemas autónomos também não deverão ser todos iguais.

China 2025, EUA 2026, Europa… em breve?

A Mercedes-Benz e os restantes fabricantes europeus de automóveis são muitas vezes criticados por não conseguirem igualar a velocidade de desenvolvimento tecnológico da condução autónoma dos homólogos chineses ou mesmo da Tesla. Mas a verdade é que são estes concorrentes que têm registado os acidentes fatais nos últimos anos.

E é sabido como as marcas tradicionais repetem muito mais testes e durante muito mais tempo do que as chinesas ou a Tesla.

“Quando alguém compra um Mercedes, está a comprar também mais segurança”, defende Löcher. E como sabemos, a Mercedes-Benz é das marcas que mais tem feito avançar a segurança no automóvel, já com um enorme histórico de inovações: ABS (1978), ESP (1995), estacionamento autónomo (2008), certificação de Nível 3 (2021), entre outras.

Atualmente, a marca recolhe dados em tempo real com frotas de teste para alimentar a IA e melhorar a resposta em situações reais. O lançamento do Drive Assist Pro está previsto para a China ainda este ano, seguido pelos EUA em 2026. “Iremos lançá-lo também na Europa assim que a homologação nos permita”, esclarece Oliver Löcher.

Mercedes-Benz Drive Assist Pro em Xangai - vista lateral
© Mercedes-Benz Para que os automóveis tenham uma tecnologia suficientemente “madura” e as cidades estejam tecnicamente preparadas, ainda teremos de esperar vários anos.

Seja como for, os alemães sabem que o sistema melhora a cada quilómetro de estrada percorrido porque vai aprendendo com cada novo desafio que encontra. Algo que é fundamental para que se dê o passo final para os níveis mais avançados de condução autónoma (3 a 5).

Mesmo na China, a chegada do Nível 5 de condução autónoma não será imediata. Ainda faltam anos para que as cidades estejam tecnicamente preparadas e a tecnologia suficientemente madura.