Primeiro Contacto Ao volante do novo Porsche 718 Boxster: é turbo e tem 4 cilindros. E depois?

Adeus, seis cilindros

Ao volante do novo Porsche 718 Boxster: é turbo e tem 4 cilindros. E depois?

Fui de Cascais até Óbidos ao volante da mais recente heresia (segundo alguns...) da marca de Estugarda: o Porsche 718 Boxster. O "tal" que mudou de nome, perdeu dois cilindros e ganhou um turbo.

Porsche 718 Boxster

O que vou escrever não é pacífico (e vale o que vale…) mas acho que, regra geral, não há entusiastas mais avessos à mudança do que os entusiastas da Porsche – não são a maioria mas fazem muito barulho.

Por vontade de algumas fações mais radicais da casa de Estugarda, a Porsche nunca teria fabricado o Boxster (986), o Panamera, ou o Cayenne. O primeiro porque era o Porsche «dos pobres», o segundo porque era uma berlina, e o último porque era um SUV e a Porsche, marca com tanta tradição no desporto automóvel não devia fazer familiares nem tão pouco SUV’s.

Também podia falar do 914, do 924 ou do 928 – que o único sacrilégio que cometeram foi não se chamarem 911 – mas acho que já fiz valer o meu ponto. Tivesse a Porsche dado ouvidos a essa minoria conservadora e hoje a marca certamente não existiria tal qual a conhecemos – e não era para melhor…

Ironia das ironias, ao contrário de uma significativa franja do seus entusiastas, a Porsche sempre foi uma marca voltada para a vanguarda e para a inovação. Só isso explica a sobrevivência e o sucesso de uma marca tão pequena, tanto no panorama desportivo como na produção de veículos de série. A Porsche, melhor que ninguém, sempre soube interpretar a evolução dos tempos e agir em conformidade.

Novos tempos, nova fórmula

O novo Porsche 718 Boxster também é filho dessa interpretação constante que a Porsche faz dos «novos tempos». Por muito nobre e melodiosa que a antiga motorização fosse, as normas ambientais cada vez mais rígidas não se compadecem com romantismos e a marca fundada por Ferdinand Porsche sabe isso melhor que ninguém.

Perante estes factos incontornáveis, a marca despediu-se do antigo motor flat-six atmosférico que equipava a geração 981 e adoptou uma mecânica turbo de quatro cilindros opostos derivada diretamente do Porsche 911 (geração 991.2) em duas versões: 718 Boxster de 2 litros com 300 cv e 380 Nm; e 718 Boxster S de 2.5 litros com 350cv e 420 Nm.

Face a esta mudança – e conhecendo os clientes que tem… – talvez a Porsche tenha sentido necessidade de justificar a adopção de um motor turbo de quatro cilindros com motivos históricos. E para essa missão, a Porsche foi até à década de 50 desenterrar o nome 718. Época em que o ligeiro Porsche 718 RSK de quatro cilindros, vencia em Le Mans e na lendária Targa Florio.

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Se a adopção do nome 718 foi só para justificar-se perante os mais acérrimos defensores da mecânicas de seis cilindros opostos, não havia necessidade. O novo motor do 718 Boxster vale por si, com ou sem motivos históricos à mistura.

Falando sobre o motor…

Face às antigas unidades atmosféricas, o som não é o mesmo. Não é, nem podia ser. Em todo o caso, quem ouve os novos 718 Boxster ao longe sabe que «vem lá» algo especial. Não é preciso ser um profundo conhecedor de mecânicas para dizer “sim… aproxima-se um Porsche”. Um quatro cilindros com raça.

Mas ao contrário do que seria espectável, gostei mais do ronco da versão 2.0 litros (com escape normal) do que do ronco da versão 2.5 litros equipada com escape desportivo (que recorre a uma válvula by-pass para aumentar ou diminuir a ressonância no sistema de escape). Acho que a Porsche na versão Boxster S se esforçou demasiado para criar um som de escape tipo flat-six. No 2.0 o som pareceu-me mais natural e menos dramático. Mas este é um campo muito(!) subjetivo…

Porsche 718 Boxster (6)

Esquecendo o som, se há campo que não é nada subjetivo são as performances. E nesse particular os novos motores turbo não dão a mínima hipótese ao antigos motores atmosféricos. A versão 2.0 litros foi uma vez mais uma agradável surpresa. Respira com vontade e decisão até às 7.500 rpm e impulsiona o conjunto dos 0-100km/h em apenas 4,7 segundos (-0,8 seg.) e só pára nos 275km/h (+11km/h) de velocidade máxima. O Boxster S, fruto da sua potência superior, consegue cumprir os 0-100km/h em 4,2 segundos (-0,6seg.) e atinge os 285 km/h (+8km/h).

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Mais do que a performance, aquilo que distancia verdadeiramente estas duas motorizações é o preço. A versão 718 Boxster custa 64.246€ e a versão 718 Boxster S custa 82.395€. No total, são 18.149€ de diferença. A escolha é tua: um Boxster com mais 50cv ou uma versão recheada de equipamento?

Uma coisa é certa: há umas gerações atrás dificilmente consideraria comprar a versão menos potente, hoje essa decisão é mais difícil de tomar. O motor 2.0 flat-4 cumpre exemplarmente a sua função.

Ao volante

Naturalmente, gosto mais de motores aspirados mas a verdade é que os motores turbos evoluíram imenso. Falar de turbo lag nestas novas motorizações é quase um preciosismo – ele existe mas é diminuto. Além do mais, ganha-se imenso em binário. A título de exemplo, no 718 Boxster S o binário máximo está disponível logo às 1.900 rpm contra as tardias 5.300 rpm da geração anterior.

Na vida real, é a diferença entre pisar o acelerador (mesmo numa mudança alta) e deixar para trás qualquer familiar apressado, ou ter de recorrer à caixa para obter essa resposta.

Porsche 718 Boxster (3)

O caso muda de figura numa utilização em circuito, onde temos de moldar as curvas com o acelerador. Situação na qual um atmosférico ganha vantagem, ao oferecer melhor feeling quando o objetivo é conservar o máximo de momento em curvas longas ou sair limpo em curvas lentas – por isso dificilmente vão ver-me defender a adopção de um motor turbo num Cayman GT4.

Além do mais, no dia a dia, onde em 90% das ocasiões andamos em modo cruzeiro, sabe bem ter uma curva de binário “gorda” pronta para nos catapultar para longe daquele camião TIR que segue à nossa frente. Portanto, não vou chorar a perda dos dois cilindros nem a adopção do turbo.

Modo de ataque: ligado

Atacando as primeiras curvas em estrada nacional, o 718 Boxster puxa dos galões e apresenta um comportamento exemplar: equilibrado, intuitivo e natural. Mesmo com o piso molhado não há reações estranhas. O PASM (Porsche Active Suspension Management), agora regulável através de um botão no volante, faz milagres pelo comportamento do novo 718. Com o modo Sport selecionado, sente-se todo o carro mais justo e ligado à estrada, sem “folgas” entre aquilo que foi o nosso comando e o output dado pelo carro.

Porsche 718 Boxster (15)

A Porsche diz que as ligações ao solo estão mais firmes, para lidar melhor com o acréscimo de potência e com as acelerações laterais, ainda assim, em modo «normal» não se sente o 718 mais desconfortável por isso. Esta afinação é bem vinda.

Há mais vida para além do motor

Ainda que se mantenha muito semelhante à geração anterior, 80% dos painéis do Porsche 718 são novos. As luzes negras na traseira com nova assinatura, e a frente mais estilizada são as maiores novidades. Também as jantes são novas, apresentando novos desenhos.

Por dentro, o novo sistema PCM (Porsche Communication Management) e o novo volante inspirado no 918 são as grandes novidades. Mudanças que somadas fazem do novo Porsche 718 Boxster mais do que um novo modelo, uma evolução do modelo anterior. À excepção do som (que não é mau…), todas as mudanças foram para melhor.

Ao volante do novo Porsche 718 Boxster: é turbo e tem 4 cilindros. E depois?

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