Opinião Audi a caminho da Fórmula 1 mas a que custo?

Fórmula 1

Audi a caminho da Fórmula 1 mas a que custo?

Daqui a dois anos a Audi entra na Fórmula 1 usando a base da Sauber. Apesar de 2026 ainda estar a uma certa distância, a controvérsia já se instalou.

Monolugar de F1 da Audi - vista superior
© Audi

Para os fabricantes de automóveis que não estão na Fórmula 1, a modalidade é olhada com um misto de cobiça e de inveja.

Ainda recentemente, Carlos Tavares — o agora ex-CEO da Stellantis — me dizia nos bastidores de uma corrida de Fórmula E, “as marcas de automóveis têm de estar no automobilismo e, de longe, a modalidade que tem mais notoriedade em todo o mundo é a F1, mas isso tem um custo”.

Para que seja possível cobrir esse custo, é quase sempre necessária muita engenharia financeira: apenas um terço da equipa da Mercedes-AMG, por exemplo, pertence ao fabricante alemão, sendo o resto do capital dividido entre Toto Wolff, o seu diretor-executivo, e a empresa química Ineos.

Já a Alpine vai continuar na F1, mas deixa de fabricar os seus motores — no futuro, passarão a ser construídos pela Mercedes-AMG —, o que permitirá reduzir custos, algo que já acontece em várias outras equipas.

Monolugar de F1 da Audi - detalhe
© Audi

Em 2025 só vão existir três fabricantes de motores a equipar os 20 monolugares de F1: Mercedes-AMG, Honda e Ferrari. Mas, para a Audi, está fora de questão correr com um motor que não seja seu, claro, ou dificilmente poderia retirar os proveitos de marketing para quem triunfa na Fórmula 1, nem fazer jus ao seu slogan Vorsprung durch technik, que é como quem diz, “Progresso através da tecnologia”.

Em agosto de 2022, o então diretor-executivo da Audi, Markus Duesmann (já afastado), anunciava a entrada da Audi no “grande circo” da F1, através da aquisição da equipa Sauber por uma verba (que os rumores disseram situar-se) entre os 300 milhões de euros e os 350 milhões de euros. Na mesma altura, Duesmann adiantou ainda que este seria o primeiro de vários investimentos multimilionários neste projeto.

Engenheiros, diretores de equipa, especialistas de aerodinâmica e pilotos, entre tantos outros, fazem-se pagar a peso de ouro. E se esta é a disciplina rainha do desporto automóvel à escala planetária não custa perceber que as compensações financeiras em forma de salários sejam proporcionalmente elevadas.

Acontece que, desde o anúncio de Duesmann, as marcas premium alemãs ficaram sob forte pressão financeira, causada pela quebra acentuada de vendas de automóveis na China, mas também pelo estagnar das vendas de carros elétricos na Europa — que já ditou o encerramento da fábrica da Audi em Bruxelas, agendado para o final de fevereiro.

Agora, junta-se a tudo isto a ameaça das tarifas punitivas “a la Trump”, naquele que é um dos mais importantes mercados para a Audi em todo o mundo.

Ainda que sem confirmação oficial, fala-se numa redução drástica de funcionários da Audi, a começar pela Alemanha (4500 trabalhadores ou cerca de 15% da força laboral, quase metade na área do desenvolvimento de veículos), mas também fora do seu país.

Se em alguns departamentos da empresa (e também fora dela) não faltou quem questionasse a lógica de investir na Fórmula 1 — quando os motores de combustão têm certidão de óbito passada para meados da próxima década —, agora são os sindicatos que já vocalizam um protesto bastante pertinente: quantas pessoas vão perder o seu emprego para ser possível fazer corridas de automóveis?

Patrocínios avultados

Para poder avançar com o seu plano de entrada na Fórmula 1 e num contexto tão cinzento, a Audi negoceia agora a (re)venda de ações da equipa em preparação. O Emirado do Qatar está interessado em tornar-se acionista através dos seus fundos soberanos, cujos bolsos para projetos de apoio financeiro milionários não têm fundo.

Por alguma razão o calendário de F1 de 2024 teve quatro corridas nos Emirados, mais do que as realizadas nos Estados Unidos (três) e na China (uma), deixando bem claro que não é a dimensão do mercado/indústria e muito menos da população que define por onde se move a caravana mais rica do mundo…

Audi F1 - Apoio do Qatar
© Audi Gernot Döllner, CEO da AUDI AG e Presidente do Conselho de Administração da Sauber Motorsport AG, com Mohammed Al-Sowaidi, CEO da QIA (Qatar Investment Authority), na oficialização do apoio da QIA à Sauber, futura equipa de Fórmula 1 da Audi.

Esta almofada financeira é um «mal» necessário porque a marca alemã precisa de liquidez e com uma certa pressa. A esperança para a Audi é que este seja um investimento bem-sucedido e que assim que os seus carros estiverem na grelha de partida, o dinheiro comece a “reverter a sua trajetória”, deixando de sair apenas dos cofres da empresa.

As principais fortunas são as que vão passar a chegar dos patrocinadores e, sobretudo, os muitos milhões dos direitos televisivos distribuídos pela Liberty Media, que fazem com que as equipas de ponta como a Mercedes-AMG, a Ferrari, a McLaren ou a Red Bull sejam lucrativas.

No entanto, não nos podemos esquecer que essas são as equipas de maior sucesso da Fórmula 1 e que a Sauber definhou em 2024, arrastando-se penosamente na posição da pior equipa. Por causa disso, e mesmo com um progresso exponencial, dificilmente a Audi irá estar no pelotão da frente logo em 2026.

Outra limitação efetiva do dinheiro fresco que vem das arábias é que ele não pode ser demasiado. A Federação Internacional do Automóvel (FIA) monitoriza, com bastante detalhe, os gastos das equipas na Fórmula 1, para que exista um maior equilíbrio e também para que exista alguma ética e «moralidade».

Ao ponto de a Audi já ter recebido uma «benesse» ao ser autorizada a ter gastos extra com salários, devido ao facto de a sede da equipa de F1 ser na Suíça. País onde os custos laborais (salários e custos associados) são, pelo menos, 30% mais elevados do que em qualquer outra parte do mundo. Isto para desagrado de todas as outras nove equipas que são contra esse regime de exceção…