Opinião Apenas demorámos 20 anos a decidir o que fazer à inspeção das motas

Inspeções

Apenas demorámos 20 anos a decidir o que fazer à inspeção das motas

Para quê decidir hoje o que podemos adiar para amanhã? A inspeção às motas foi adiada até decisão em contrário. Que será, mais ou menos, quando calhar.

inspeção às motas
© Honda

Demorámos mais de 50 anos a definir a localização do novo aeroporto de Lisboa. Para decidir se avançávamos ou não com a inspeção às motas levámos menos de metade do tempo. Cerca de 21 anos para ser exato. Há esperança: é uma melhoria clara.

Dir-me-ão que não se compara a complexidade de uma decisão com outra. É verdade. Mas não é menos verdade que nós, portugueses, temos uma capacidade notável de complicar o que é simples e vice-versa. Eu sei, é complicado…

Por isso volto a repetir: levámos 21 anos a decidir se avançávamos ou não com a inspeção às motas. Para percebermos a extensão da novela, vou recapitular.

Moto no meio do trânsito
© Dmytro Pidhrushnyi

A primeira vez que a inspeção técnica obrigatória aos motociclos foi anunciada foi no Plano Nacional de Prevenção Rodoviária de 2003. Só tivemos de esperar até 2012, pelo Decreto-Lei n.º 144/2012, para reduzir essa intenção a escrito. Entretanto ficou tudo em «águas de bacalhau».

Seguiu-se uma espera de mais 10 anos. O Decreto-Lei n.º 29/2023 estabeleceu a obrigatoriedade de inspeções a partir de 2024, mas foi tudo adiado para 2025 devido à falta de regulamentação. Quando toda a gente pensava que ia ser desta… não foi. O parlamento reverteu tudo, aprovando a proposta do PSD.

Se aplicarmos isto a outras áreas, percebemos o nível de convicção, vontade e capacidade de decisão da nossa elite política.

Não escrevi esta opinião mais cedo por isso mesmo. Esperei que entre 14 de novembro e 6 de dezembro houvesse nova mudança de posição. Mas analisando bem as coisas, sabemos que estes assuntos só conhecem novidades de 10 em 10 anos.

Por isso, daqui a 10 anos voltamos a falar, pode ser? E atenção! Nunca é tarde para mudarmos de ideias ou revertermos uma medida errada — na minha opinião a inspeção aos motociclos era uma delas —, mas a sensação com que fico é que não há convicções profundas sobre praticamente coisa nenhuma.

E não haveria problema nenhum se não houvesse mesmo um problema. Há um problema: é que no «vai-e-vem» alguém tem que tomar decisões. Quantos milhares de euros foram gastos pelos centros de inspeção para se prepararem para inspecionar motociclos? E do lado dos motociclistas, quantos terão vendido aquela mota que só tiravam da garagem para ir ao pão no verão, para não terem de se chatear com as inspeções?

Podemos estender isto a outras áreas? Sem dúvida. A previsibilidade jurídica e fiscal em Portugal está pelas ruas da amargura, com as consequências que nós conhecemos. E o pior é que acho que não somos assim tão diferentes dos restantes europeus. Basta ver o entusiasmo com que lá fora nos elegem para cargos de relevo, de Durão Barroso a António Costa.

A Europa adora-nos e nós adoramos ser europeus. Por isso, vamos já falar do adiamento das metas de emissões no setor automóvel para 2025, ou é demasiado cedo? A minha costela europeia coligou-se com a portuguesa e disse-me que esse assunto fica para o ano que vem. Para quê decidir hoje o que podemos adiar para amanhã?