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Ford já tem resposta contra os elétricos baratos chineses

Para lançar a sua nova família de elétricos com preços acessíveis a Ford começou pelo fim: reinventou completamente a forma como os constrói.

Ford elétricos

Estima-se que os elétricos chineses tenham uma vantagem competitiva de 20%. Como anular essa vantagem é o que tem tirado o sono a muitos executivos da indústria automóvel, mas a Ford acabou de revelar a sua resposta: reinventar a forma como concebe e constrói automóveis.

E é uma solução de tal forma revolucionária que a Ford chamou-lhe um “momento Model T”. Considerando que o Model T foi o modelo que mais contribuiu para a democratização do automóvel, a afirmação do construtor norte-americano é, no mínimo, ambiciosa.

Mas tal como no Model T, a revolução não foi o carro em si, mas o sistema de produção em série. Este reduziu significativamente os custos de produção e, consequentemente, o preço do veículo. A Ford parece estar a querer repetir a história, desta vez, para vingar onde os chineses estão a dominar: o automóvel elétrico.

Animação com os modelos previstos da Ford.
© Ford Como dá para ver, a plataforma vai permitir os mais variados tipos de veículo: de uma pick-up a um SUV com três filas de assentos, passando por furgões e carros de passageiros.

O plano passa por lançar oito novos modelos elétricos, todos assentes numa nova plataforma, a Ford Universal EV Platform. Daqui vão sair carros, SUV e furgões, mas o primeiro a chegar em 2027 (nos EUA) será uma nova pick-up de quatro portas (mais pequena que a Ranger), por 30 mil dólares (aprox. 26 mil euros).

A marca da oval azul não avançou muitos detalhes sobre a nova pick-up, mas deixou várias promessas: será tão rápida como um Mustang EcoBoost e terá mais espaço para passageiros que um Toyota RAV4, além de ter uma caixa de carga e uma frunk.

Revolução na linha de produção

Mas a grande novidade está na forma como esta nova pick-up e os outros modelos consequentes serão concebidos e construídos. É aqui que a revolução vai acontecer para reduzir os custos e conseguir preços mais competitivos, sem prejudicar a rentabilidade, que continua a ser um dos calcanhares de Aquiles dos elétricos.

infografia sobre a nova linha de montagem em árvore e comparação com linha de montagem linear
© Ford As diferenças são fáceis de ver entre a linha de montagem linear usada atualmente e a futura linha de montagem em árvore, que inclui três linhas individuais, uma para cada módulo

Em vez de uma linha de montagem tradicional, linear, a Ford quer introduzir o conceito de “árvore de montagem” (assembly tree). Nesta solução o veículo é dividido em três partes — módulo dianteiro, módulo traseiro e o módulo central com a bateria —, cada uma com a sua própria linha de montagem. No final, as três partes convergem para uma linha só para serem unidas.

Quais as vantagens? De acordo com a Ford, não só facilita o trabalho dos funcionários (melhor acesso às partes), como o tempo de montagem pode ser reduzido em 40% (comparado com os veículos que produz em Louisville, onde vai fabricar a nova pick-up).

Só a plataforma em si, que vai recorrer a peças de alumínio fundidas de grande dimensão — a que a Ford chamou unicastings, mas é a mesma tecnologia giga-casting ou mega-casting já vista na Tesla e noutros construtores —, reduz em 15% o tempo de produção e o número de estações de trabalho em 40%. O número de peças será, assim, 20% inferior — só em parafusos, rebites, etc. vai poupar 25% por veículo.

Ainda no caso da pick-up, que está mais perto de chegar ao mercado, a marca refere que conseguiu reduzir as cablagens em mais de 1,3 km, o que se traduz em menos 10 kg.

Jim Farley, diretor-executivo da Ford, resume a abordagem: “Começámos por desenhar a forma como queríamos fabricar o automóvel e só depois resolvemos os problemas de engenharia”. A base do projeto não foi o automóvel, mas o processo que o cria.

Baterias LFP

Para alimentar esta nova geração de elétricos a Ford optou por baterias prismáticas de fosfato de ferro-lítio (LFP), que são entre 20% a 30% mais baratas que as energicamente mais densas NMC (níquel, manganês e cobalto).

A bateria (módulo central) fará parte da estrutura do veículo evitando a adição de componentes redundantes. Será montado de forma independente, já com os assentos, consolas e carpete, antes de ser unido aos módulos dianteiro e traseiro. Resultado? Melhor aproveitamento do espaço interior, maior rigidez estrutural e centro de gravidade mais baixo.

Depois de tudo isto, a Ford deixa uma promessa ambiciosa: ao fim de cinco anos o custo total de propriedade (TOC) será inferior ao de um Tesla Model Y usado com três anos.

Investimento pesado

Para tornar esta visão realidade a Ford vai investir cerca de 5000 milhões de dólares (cerca de 4,3 mil milhões de euros), dos quais dois mil milhões de dólares (1,72 mil milhões de euros) serão para modernizar a fábrica de Louisville, no Kentucky, onde será montada a nova pick-up.

Os restantes três mil milhões de dólares (2,58 mil milhões de euros) serão para o novo complexo de produção de baterias no Michigan. A Ford estima que, ao todo, serão criados 4000 postos de trabalho diretos nos EUA.

Jim Farley, diretor-executivo da Ford, durante a apresentação na fábrica de Louisville, no Kentucky.
Jim Farley, diretor-executivo da Ford, durante a apresentação na fábrica de Louisville, no Kentucky.

O próprio CEO afirma que este é um plano arriscado: “Não há garantias sobre este projeto. É uma aposta. Há um risco. Não consigo afirmar a 100% de que irá funcionar”. Mas se funcionar, pode colocar a Ford em melhor posição para enfrentar não só os elétricos chineses como a conterrânea Tesla.