Notícias Gilbert Ranoux, CEO do Credibom. “Portugal é uma economia atrativa e resiliente”

Entrevista

Gilbert Ranoux, CEO do Credibom. “Portugal é uma economia atrativa e resiliente”

Economia, mobilidade e financiamento verde em 2023. Foram alguns dos temas abordados por Gilbert Ranoux, CEO do banco Credibom, em entrevista à Razão Automóvel.

gilbert ranoux, CEO do Credibom
© Razão Automóvel

Go to the future. Foi sob a égide desta frase — que numa tradução livre significa algo como “rumo ao futuro” — que Gilbert Ranoux, CEO do banco Credibom, revelou a estratégia do banco para os próximos três anos no evento anual do banco.

Entrevistámos Gilbert Ranoux, à margem deste evento, para abordar temas como as previsões económicas para 2023, financiamento verde e a transformação em curso no mercado automóvel.

Previsões que se revestem de especial importância por dois motivos. O banco Credibom é líder nacional no financiamento automóvel — representa 80% da sua atividade — e é detentor de um dos principais motores de busca automóvel em Portugal, o Pisca Pisca. Um portal lançado em 2020, que em 2023 vai conhecer importantes novidades.

TÊM DE LER: Um milhão de veículos até 2026. Crédit Agricole acelera «a fundo» no setor automóvel

O Credibom sempre foi uma empresa focada no financiamento automóvel. Claro que diversificámos e continuamos a diversificar. Quando olhamos para os nossos negócios, talvez nos últimos quatro anos, é 80% auto vs 20% outros.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom

Otimismo moderado para 2023

Em Portugal desde 2019 — ano em que assumiu a liderança do Banco Credibom — Gilbert Ranoux já se habituou aos «ventos desfavoráveis» da economia.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom com Guilherme Costa
Engenheiro de formação, Gilbert Ranoux iniciou a sua carreira profissional na indústria aeroespacial. Uma experiência que tem vindo a revelar-se útil para «sobrevoar» os problemas da economia nacional. © Razão Automóvel
Desde que assumiu funções no banco Credibom, ainda não conheceu um ano em que as previsões para o clima económico não estivessem envoltas numa «nuvem negra». Dois anos de pandemia e o ano de 2022 marcado pela guerra na Ucrânia assim o ditaram.

À beira de 2023, o cenário continua a mostrar-se incerto. Ainda assim, Gilbert Ranoux assume-se otimista.

Em termos de economia, estive na apresentação do governador do Banco de Portugal, onde foi divulgado antecipadamente o relatório de estabilidade financeira do Banco de Portugal. Conversámos com os CEO de todos os bancos sobre as previsões para 2023. Aquilo que destaco é que existe um consenso e um otimismo razoável sobre a capacidade da economia portuguesa superar os desafios do próximo ano.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom
LEIAM TAMBÉM: Stellantis e Politécnico de Coimbra juntos para produzir um elétrico em Mangualde

Perguntámos a este responsável qual o fundamento para o otimismo moderado: “é oriundo da história recente, mais concretamente da Covid-19. Houve ajudas fundamentais do Governo e as pessoas têm resistido, têm sido resilientes”, afirmou Gilbert Ranoux, que antes de assumir funções em Portugal esteve na China, entre 2012 e 2018, como diretor-geral da GAC Sofinco — também subsidiária da Crédit Agricole.

Na verdade, todos os stakeholders da economia têm sido resilientes e não houve nenhuma catástrofe. O segundo ponto é que, quando ouvimos os grandes bancos, eles dizem que as contas financeiras das empresas, este ano, vão ser muito boas. Isso significa que as empresas estão numa posição mais favorável, estão mais fortes.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom

Destes pontos, ainda assim, há um que, para Gilbert Ranoux, é talvez o indicador mais importante: o emprego em Portugal. A taxa de desemprego nunca esteve tão estável como nos últimos anos. “Portugal é super atrativo e tem tido muito investimento direto, há muita gente nova a chegar. É uma imigração com alta qualidade e entrega valor à economia. Por isso, sim, otimismo razoável. Não estou preocupado”, terminou.

Stéphane Priami, CEO do CA Consumer Finance e Gilbert Ranoux, CEO do banco Credibom
Stéphane Priami, CEO do CA Consumer Finance (esq.) e Gilbert Ranoux, CEO do banco Credibom (dir.).

O crédito mal-parado e as lições do passado

Devido ao aumento das taxas de juro, um dos receios para 2023 é o aumento do crédito mal-parado. Um cenário que Gilbert Ranoux afasta, recordando mais uma vez as lições recentes: “ainda há memória do quão mau foi o período de 2010 a 2012. Os stakeholders do setor sabem como devem reagir e estão dispostos a compromissos”.

Quando olho para o portfólio da Credibom, é notavelmente estável. E além disso, há medidas que foram tomadas, como os bancos terem produtivamente renegociado as hipotecas, viabilizado créditos com os clientes em situações mais frágeis. Não houve contaminação nem efeito bola de neve.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom

Relativamente a 2022, desafiámos Gilbert Ranoux a fazer um resumo da atividade deste ano que agora finda: “vamos ter o nosso melhor ano. Estamos mais fortes. O setor no geral está forte. Quando olhamos para a capitalização dos bancos, para o NP Ratio (margem de lucro sobre as vendas), tudo está bem — bastante bem até. Não é apenas otimismo razoável, é mesmo otimismo”, explicou-nos.

A maior transformação da década

A digitalização e mudança de hábitos dos consumidores está a colocar novos desafios às instituições financeiras. Mudanças que no caso da Credibom — por grande parte da sua atividade estar ligada ao setor automóvel — é ainda mais visível.

Este foi um tema já amplamente abordado por Stéphane Priami, CEO adjunto do Crédit Agricole, numa recente entrevista à Razão Automóvel.

Stéphane Priami, CEO do CA Consumer Finance
Stéphane Priami, CEO do CA Consumer Finance, esteve em Portugal para apresentar a estratégia do Banco Credibom, subsidiária do banco liderado por si.

Palavras corroboradas por Gilbert Renoux a que acrescentou mais um ponto:

Acredito que, neste tema, o que vai acontecer é que tudo vai mudar, inclusive os canais de distribuição. Acho que o ponto-chave para uma empresa como o Credibom — mas que também é verdade para os nossos homólogos — é ser capaz de criar uma relação com a comunidade de potenciais compradores. E para isso acontecer, é preciso entregar valor a esta comunidade.

Gilbert Ranoux, CEO do Banco Credibom

Uma das formas encontradas pelo Credibom para “entregar valor” foi através da criação do portal Pisca Pisca, ao qual Gilbert Ranoux dedicou uma parte substancial desta entrevista.

“Com o Pisca Pisca criámos uma comunidade muito forte. Temos na marca Pisca Pisca qualidades muito sólidas. É jovem, é disruptivo, é techie, e tudo isto são «supergenes» capazes de fazer avançar mais produtos e mais ofertas aos nossos clientes. E nesses produtos e ofertas mantemos o conteúdo original da marca”, terminou.

A importância do Pisca Pisca na estratégia

Lançado em 2020, o Pisca Pisca é hoje uma das plataformas mais importantes na estratégia do banco Credibom. Mas o lançamento deste motor de busca — que hoje congrega mais de 40 mil anúncios no segmento dos carros usados — não foi fácil.

Gilbert Ranoux fez um balanço dos últimos dois anos e revelou algumas dos planos desta plataforma para os próximos três anos.

RA: Dois anos volvidos desde o lançamento do Pisca Pisca, já passou tempo suficiente para fazer um balanço da decisão?

Sim, sem dúvida. Não foi fácil, mas tem sido um enorme sucesso. Lançámos o Pisca-Pisca na mesma altura que a pandemia do Covid chegou e ninguém prestava atenção a outra coisa que não o Covid. Mas acredito que foi de certa forma uma boa altura porque mostrámos ao mercado o nosso compromisso.

Foi um momento difícil, mas acreditamos que os revendedores valorizaram bastante o facto de termos continuado. Passámos a mensagem de que estamos aqui e mantivemos uma grande parte da quota de mercado que ganhámos naquela altura.

RA: Além dos automóveis, ouvi-o falar em liderar o financiamento verde. O que significa isso?

Temos duas áreas. Temos trabalhado com a Roland Berger (empresa de consultoria) para perceber como funciona o mercado do “verde”. E basicamente chegámos a dois mercados que podem ser interessante para nós, em termos de «verde». Até agora, o «verde» é renovação de casas, maus isolamentos, tudo isso cria perda de energia.

Por isso, a área de renovações de casa é um mercado chave e que pode crescer. E ao renovar a casa, no final do dia, a conta da eletricidade fica bem mais baixa. Queremos entre nesse segmento. A segunda área na nossa estratégia de home equipment é conseguir fazer acordos com grandes retalhistas e oferecer produtos específicos dependendo do rating ecológico.

Sabe, a classificação A, B, C e D. Quiçá, até podemos incentivá-los a comprar um produto mais caro, mas mais «amigo do ambiente» e que dura mais tempo.

RA: E como é que se faz isso?

Queremos criar um diferente mindset e para isso o financiamento é muito importante. Ser capaz de investir numa renovação da casa, este é o tipo de economia e/ou negócio que os clientes poderão fazer a longo prazo.

Depois, quando passamos para a parte automóvel, o que pretendemos é usar o Pisca Pisca como alavanca, criando um projeto dedicado a esta área «verde».

Fiat 500e com cabo de carregamento ligado à porta de carregamento

RA: É um novo ramo do Pisca Pisca?

É algo que estamos a considerar neste momento, mas sim, é uma espécie de novo ramo que será totalmente dedicado ao «verde», não só em ofertas automóveis mas para todo o ecossistema.

RA: Então vão aproveitar o facto de estarem já ligados à industria automóvel para tentar chegar a um novo público?

Exatamente. E para aqueles que queiram carregar as baterias do carro em casa, por exemplo, poderemos oferecer essa possibilidade, através de parcerias e de financiamento, para que as pessoas possam ter a sua própria estação de carregamento em casa.

Acredito que há muitas “barbas falsas” neste mercado. E como é um mercado que está a evoluir muito depressa, as pessoas ainda não compreenderam muitos dos conceitos e da fase em que estamos neste tema. O publico precisa de conhecer melhor as novas formas de mobilidade.

O Pisca Pisca não deve estar só ligado ao automóvel, mas a outras formas de mobilidade.

Por exemplo, adorávamos fazer parcerias com fabricantes de bicicletas elétricas, o que faria todo o sentido num Pisca Pisca verde. Queremos oferecer produtos de mobilidade aos nossos clientes. Outra característica importante para a marca é segurança na compra. A confiança é algo extremamente importante, especialmente entre o revendedor e o cliente. Penso que o Pisca Pisca transmite e garante essa confiança, mas estamos empenhados em melhorar.

RA: Ainda para mais quando falamos em carros usados…

Sem dúvida. É preciso garantir aos clientes e também aos revendedores que os carros nos anúncios existem, que se forem ao stand os carros estarão lá. Por outro lado, estamos também a trabalhar no desenvolvimento de garantias, de forma a garantir que o carro que está a ser vendido é um bom carro.

Queremos também fazer parcerias com revendedores para oferecer funções de backoffice que lhes permitam melhorar a gestão de stock dos seus carros: mais estatísticas em termos de preço, detalhes sobre os modelos, a hipótese de colocar informação relevante sobre o veiculo.

Tudo isto torna a venda mais transparente e reforça a questão da confiança. A confiança é, sem dúvida, a palavra-chave na relação entre os nossos parceiros e os clientes.

RA: Consideram oferecer um modelo de negócio baseado em subscrições, no Pisca Pisca? Por exemplo, financiar por 300 €/mês com seguro.

Sim. Mas esse tipo de produto já existe. Esse modelo já foi criado em Itália e funciona muito bem. Não sei se o mercado em Portugal é suficientemente grande para isso, até porque quando falamos em posse vs utilização não existem muitos dados.

A ideia de lançar o Pisca Pisca em Portugal foi do Crédit Agricole ou foi um projeto do Credibom que foi proposto ao Crédit Agricole?

A segunda opção, um projeto do Credibom apresentado ao Crédit Agricole. Não existia competição suficiente no mercado e havia um grande número de pedidos por parte de revendedores para criar algo ou fazer parcerias. Contudo, quem saía a perder era o consumidor. Por isso, decidimos entrar no “jogo” e solucionar o mercado português.

O que está a acontecer é que em qualquer ponto do mundo os revendedores estão a aperceber-se de que precisam de assumir o controlo dos seus destinos, dos seus negócios, da sua base de clientes.

Precisam de enriquecer a relação que têm com os seus clientes porque as marcas de automóveis estão a tornar-se cada vez mais independentes, especialmente quando falamos de carros elétricos, que precisam de menos manutenção. Por isso estamos a preparar o Pisca Pisca, tecnicamente, para funcionar em qualquer local, através da cloud. Desta forma, qualquer oportunidade que se apresente, permite-nos entrar no mercado noutros países.

Renault Zoe a carregar

Está tudo por reinventar. E penso que os revendedores têm poder para negociar e os agentes independentes deixam de “depender” tanto de financiamento das construtoras e têm mais liberdade para gerir a sua base de clientes e fazer propostas.

RA: É uma grande transformação.

Sim, e aquilo a que assistimos é que os revendedores não querem ser atacados por duas frentes diferentes. A primeira são as marcas de automóveis. A segunda são grandes websites de empresas comerciais que aumentam os preços quando assim o entendem e que têm acesso direto aos clientes, aumentando ainda mais os preços. O grande perigo é estar entre estes dois lados da “barricada”.

Estamos muito felizes com isso, porque ter desenvolvido esta ideia inicialmente em Portugal provou ser um grande ativo, e que voltou a equilibrar o mercado. Além disso, é «made in Portugal».